Observador Isento (Unbiased Observer)

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Tuesday, February 24, 2009

Dilemas Demográficos

Luiz A. Góes

O artigo "O Suicídio Demográfico", publicado em 2006 pelo italiano Massimo Introvigne ( se preferir leia no original em Il_Suicidio_Demografico ), analisa o declínio da população da Europa Ocidental (em que a Itália já é um dos países mais afetados), considerando-o irreversível a ponto de prever que as populações da Itália, da França, da Espanha, da Holanda e da Alemanha estarão, se mantidas as taxas de natalidade atuais, reduzidas à metade no curso de uma geração.
E considera esse fenômeno um suicídio demográfico, porque abrirá as portas da Europa definitivamente para um invasão de imigrantes do mundo islâmico e oriental com idade média substancialmente menor do que as das populações locais, os quais se apossarão da maiór parte dos postos de trabalho e das funções produtivas e de serviços em geral que não contem com pessoas provenientes das populações locais para preenchê-las. Daí para se tornarem maioria será um pulo.
Segundo Introvigne, a Europa Ocidental se tornará então uma "Eurábia", prevendo que a maioria desses imigrantes será proveniente dos países árabes, ou islâmicos. Será, segundo êle, uma nova invasão dos "bárbaros", com a diferença fundamental que desta vez os "bárbaros" não precisarão sequer combater para concretizar a conquista.
O artigo é instigante, e recomendo fortemente que os interessados o leiam na íntegra (há uma tradução do referido artigo circulando na Internet, que reproduzo abaixo).
Em têrmos mais abrangentes, pode-se dizer que estamos diante de um dilema demográfico universal que seguramente afetará as vidas de nossos netos, qualquer que seja o país em que se encontrem.
De fato, na Europa Ocidental está se cumprindo com enorme precisão uma célebre lei da biologia segundo a qual "a natureza provê quantidade para substituir a falta de qualidade" ou vice- versa. Quer dizer: os de melhor forma física tendem sempre a produzir menos descendentes, enquanto que os de forma física deixando a desejar produzem mais descendentes. Dizendo de outra maneira, os miseráveis sempre têm mais filhos do que os mais abastados.
Antigamente essas proles numerosas eram até certo ponto mantidas em cheque porque também morriam muitos dos que nasciam com pouca idade, mas as vacinas desequilibraram a coisa, porque reduziram sobremaneira a mortalidade infantil sem resolver o problema da pobreza. Pode-se mesmo dizer, de maneira jocosa, que as vacinas, ao lado de seus resultados positivos, são também responsáveis pela aceleração da proliferação da miséria e da criminalidade nos quatro cantos do mundo.
Além disso, a medicina vem conseguindo prolongar cada vez mais a vida das pessoas, o que vem fazendo crescerem os contingentes de idosos e aposentados em todos os países. Assim, com o número de nascimentos se reduzido e o número de idosos aumentando constantemente, a pirâmide etária vai se invertendo. As gerações mais jóvens vão ficando escassas para preeencher todos os postos de trabalho necessários à manutenção do padrão de vida da sociedade com essa estrutura etária, e apesar dos progressos da mecanização e da automação, muitos países, particularmente vários da Europa Ocidental, vêm tendo que recorrer a imigrantes para preencher essas posições.
De fato, o crescimento do número de idosos em qualquer sociedade, ou seja, a dilatação da expectativa de vida média, apesar de ser uma benesse a comemorar, incomoda os governantes porque requer recursos financeiros para ser mantida, sem que possam contribuir com trabalho para tanto. (No Brasil o problema está sendo "resolvido" de maneira "engenhosa" pelos govêrnos contemporâneos, por meio da compressão das aposentadorias, o que vai resultar na impossibilidade de os velhos comprarem os remédios da velhice e sequer se alimentarem razoavelmente: isso vai "compensar" e manter dentro de "limites razoáveis" a vida média das pessoas: estão repetindo a eutanásia disfarçada praticada pelos antigos romanos.)
Além disso, estamos agora diante de outros aspectos que não costumavam entrar nas cogitações do mundo ocidental: os muçulmanos, os hinduistas, os bramanistas e outros grupos orientais têm como uma de suas finalidades de vida produzir muitos descendentes, algo com fundo religioso mas também com o objetivo consciente de dominar cada vez mais a terra toda. Já tornaram superpopulosos os seus países e agora se espalham por todos os países do mundo, particularmente aqueles onde a pirâmide etária está se invertendo, como na Europa ocidental. Não tenho nenhuma dúvida de que acabarão dominando mesmo, porque serão maioria, mas ao mesmo tempo estarão novamente produzindo na Europa e outras regiões do globo o outro dilema, já existente no oriente: o de superpopulação generalizada.
Esses excessos populacionais dos países superpopulosos, por sinal, tendem a migrar para os espaços vazios ainda existentes no mundo: é uma tendência inexorável.
No caso do Brasil, por exemplo, essa espécie de teima em manter a Amazônia como que vazia vai seguramente atrair numerosos contingentes de orientais que vão acabar com a floresta como a conhecemos de qualquer maneira, sem que nenhum govêrno consiga controlar o processo. E aí muita gente vai se lembrar, se estiver viva, das besteiras que os govêrnos de hoje estão fazendo com os Ibamas da vida, a política indigenista absurda e tantas coisas mais, e vai lamentar profundamente, mas tarde.
Um de meus correspondentes internáuticos, ao ler o artigo, e depois de trocar alguns comentários comigo, escreveu:
"Lembre-se que alguns dos países civilizados possuem a ‘bomba’ que salvará o planeta dos miseráveis e fanáticos.
A máquina já produz e produzirá cada vez mais riqueza e em pouco tempo a mão-de-obra miserável não será mais necessária. Até a Índia verá sua população diminuir pois,apesar da questão religiosa, não conseguirá suportar uma miserabilidade tão acentuada.
Se a população do planeta não diminuir, aí sim, o fim da civilização estará perto."
Não sei se devo prestar mais atenção ao lado pessimista dessa mensagem, prevendo o fim da civilização se o crescimento da população humana não for contido (sim, porque os animais sempre conseguem sobreviver de uma forma ou de outra), ou se olho pelo lado "otimista", com essa previsão de que a solução dos dilemas populacionais possa vir através do uso da "bomba".
Leiam o artigo do Introvigne.

O SUICÍDIO DEMOGRÁFICO
Por Massimo Introvigne (il Domenicale. Settimanale di Cultura, anno 5, n. 44, 4 novembre 2006)
http://www.cesnur.org/2006/mi_11_04.htm
O declínio da população européia parece irreversível. Dentro de cinquenta anos, viveremos na feliz Eurábia. Com as taxas de natalidade atuais, as populações da Itália, França, Espanha, Holanda e Alemanha serão reduzidas à metade no curso de uma geração. Os "bárbaros" sequer terão de combater.
O grande historiador Arnold J. Toynbee (1889-1975) dizia que se escrevem poucos livros de suspense sobre a morte de uma civilização, e por uma boa razão. Muito raramente existe um assassino: em geral, se trata de suicídio. A América está destinada a "ficar só" na luta contra o ultrafundamentalismo islâmico não – ou não apenas – porque a maioria dos governantes europeus esteja com medo ou indisposta para o combate. Ficará sozinha tecnicamente, porque dentro de menos de um século os europeus não mais existirão. Serão varridos pela demografia assim como o foi o império romano, que não caiu porque suas compactas legiões se tivessem tornado menos compactas, e sim porque já não eram constituídas por legionários romanos. Alistavam-se bárbaros, proclamando-se, apressadamente, cidadãos romanos. E, quando perceberam que estavam em maioria, tomaram o poder.
Essa é a tese do analista político neoconservador canadense Mark Steyn, no seu magnífico "America Alone: The End of the World as We Know it" (Regnery, Washington 2006), o livro mais importante de 2006, do qual se espera uma rápida tradução italiana. O tema do livro é aquele que o Papa João Paulo II chamava desde 1985, com expressão destinada a passar à história, de "suicídio demográfico" do nosso continente.
Por todo o mundo, de algum modo, o que deixa os não-europeus perplexos é que na Europa este tema dramático não esteja no centro do debate cultural e mesmo das campanhas eleitorais. Nenhum país da Europa Ocidental possui uma taxa de fecundidade por mulher que corresponda ao nível mínimo de manutenção da população (2,1 filhos por mulher) indicado pelos demógrafos. A Itália, com uma taxa de 1,2, começa a se transformar no país do mundo com menor número de nascimentos, e já o seria se dos nascidos nos hospitais se excluíssem os filhos de imigrantes residentes, mas não cidadãos italianos. A Espanha e a Alemanha disputam com a Itália esse triste primeiro lugar. A França elevou seu nível a 1,7, mas seus dados seriam semelhantes aos italianos se fossem excluídos os nascidos de mulheres – imigrantes ou cidadãs francesas – de religião muçulmana. Itália, Alemanha, Espanha e Países Baixos (também aqui, excluídos os filhos de cidadãos de religião muçulmana) não atingem o nível abaixo do qual os demógrafos acreditam que uma inversão da tendência seja impossível. Isto significa que, a manter-se a situação atual, a população de países como a Itália será reduzida à metade no curso de uma geração.
O truque da cidadania
Certamente, as estatísticas poderão ser alteradas concedendo-se a cidadania a um alto número de imigrantes residentes: parece ser esta a linha do governo liderado por Romano Prodi, mas se trata de um truque que, como recorda Steyn, já foi tentado com resultados ruinosos no império romano. Transformar os "bárbaros" (palavra que não era ofensiva e que, originalmente, indicava apenas aqueles que não falavam o latim) em cidadãos por meio de lei não fazia deles cidadãos romanos culturalmente, assim como transformar imigrantes muçulmanos ou chineses em cidadãos italianos por decreto de Prodi ou do ministro da Solidariedade Social Paolo Ferrero não significará fazer deles italianos pela cultura e pela integração. Mas o problema não é só italiano. A Alemanha perderá o equivalente à população da Alemanha do Leste em meio século; a Espanha, o equivalente à atual população de um quarto do próprio território no mesmo período de tempo. Entre tantas estatísticas, causa impacto uma já citada pelo teólogo católico americano George Weigel e retomada por Steyn, segundo a qual em 2050 a Itália será um país "sem tias": já agora a maioria das crianças italianas é formada de filhos únicos, mas em menos de quarenta anos também os adultos serão 60% de filhos únicos de filhos únicos, pessoas que nunca terão feito a experiência de ter um irmão ou uma irmã, ou, justamente, de ter um tio ou uma tia. Do "suicídio demográfico" se ocupam pouco os moralistas, mas muito os economistas, sobretudo aqueles especializados em previdência social. De fato, na Europa Ocidental – não obstante todos os países procurem adiar ao máximo possível a idade de aposentadoria – cresce inexoravelmente o número de aposentados e em diversas regiões cada trabalhador já suporta o encargo de dois aposentados.
Algum entusiasta do "modelo europeu" pode pensar – ainda que poucos tenham a coragem de o dizer – que a eutanásia à moda holandesa vai dar cabo dos velhos inúteis e resolver o problema. Outros apresentam cifras, mas não tiram conclusões. A recusa da classe política de muitas nações européias a recorrer às drásticas reformas previdenciárias sugeridas pelas instituições financeiras internacionais parece não decorrer tanto da compaixão pelos aposentados – ou do desejo de não perder os seus votos, visto que em breve serão a maioria dos eleitores –, mas de estar escondendo a cabeça na areia diante da dramática urgência do problema demográfico.
Como recorda Steyn, o suicídio demográfico é também o suicídio da social-democracia européia. Não há nenhuma garantia de que as civilizações durem para sempre. O seu modo normal de morrer é precisamente o demográfico. Além do aborto e do infanticídio, os romanos da decadência praticavam uma forma primitiva de eutanásia (por certo distante daquela em camisola branca dos Países Baixos de hoje), que consistia em abandonar os anciãos doentes sem tratá-los ou alimentá-los. Os bárbaros chegam quando estas práticas já haviam enfraquecido o império de Roma, de cujas ruínas surge – como também recorda o sociólogo americano Rodney Stark – a civilização dos tais cristãos que não praticam o aborto e que cuidam dos velhos e doentes. Mas desta vez o que vai surgir das ruínas da Europa? Não é necessário citar aqueles fundamentalistas islâmicos para quem "ri melhor quem ri por último" – e a invasão muçulmana frustrada pela via militar em Poitiers, Lepanto e Viena será bem sucedida no século XXI pela via demográfica – para perceber que a civilização européia se arrisca a sofrer o mesmo destino da romana. Dentro de vinte anos, por exemplo, "a maioria dos adolescentes nos Países Baixos será constituída de muçulmanos". Mais vinte anos, será a maioria dos adultos em idade laboral (ou talvez da população em geral, se os holandeses continuarem a ampliar, a cada dois anos, a legislação sobre eutanásia, incluindo novos casos), alguns anos depois, será a maioria dos eleitores.
Naturalmente, há quem sustente que esta "Eurábia" (a expressão se tornou conhecida por Oriana Fallaci, mas foi cunhada pelo historiador britânico Niall Ferguson) será belíssima. Quando em 1998 a seleção francesa de futebol venceu o Campeonato Mundial com um time cujos jogadores, em sua maioria, não havia nascido na França, a superioridade da civilização francesa multiétnica e multi-religiosa foi doutamente apresentada na televisão não só por um bom número de intelectuais franceses, mas também por Walter Veltroni [prefeito de Roma], na Itália. O adjetivo "multi-religiosa", com efeito, não era reduntante em relação a "multiétnica". Também a seleção brasileira, que perdeu a final daquele campeonato, era evidentemente multiétnica. Mas não era multi-religiosa: os jogadores eram todos cristãos e tinham ainda o péssimo gosto, na França do laicismo, de rezar coletivamente e publicamente e de entrar em campo fazendo o sinal da cruz.
Há pouco tempo, a revolta da periferia parisiense de 2005 fez em pedaços aquele belo sonho de utopia multi-religiosa harmoniosa e feliz. (...) O mesmo Veltroni se tornou mais cauteloso, e isto é um fato que Steyn não conhece. No desenho animado da Disney "O Galinho Chicken Little" (2005) muitos espectadores perceberam que o prefeito da cidadezinha [chamada Querce Ghiandose, na versão italiana], o presunçoso e incompetente "Rino Tacchino", fala como Veltroni, pronuncia as palavras como Veltroni e é de fato o próprio Veltroni, no sentido de que o poliédrico primeiro cidadão de Roma (cujas ocupações devem deixar-lhe evidentemente uma boa dose de tempo livre) atuou como dublador na versão italiana do filme e, no final, ainda exibiu seus dotes canoros. Como Veltroni é bom amigo de Umberto Eco – de quem desaprovo muita coisa, mas não o ensinamento segundo o qual a cultura popular deve ser levada absolutamente a sério – pode-se imaginar toda uma semiótica do nexo entre o prefeito de Roma (cujo senso de humor eu reconheço prazerosamente) e aquele de Querce Ghiandose (um nome que evoca, entre outras coisas, o partido de Veltroni, a Quercia). No filme, o prefeito é o último a se convencer de que sua cidadezinha – habitada por animais antropomorfos disneyanos – seja a cabeça de ponte de um desembarque de alienígenas na Terra. Quando os alienígenas finalmente chegam, Rino Tacchino lhes oferece primeiro a chave da cidade e depois também a do seu carro, recebendo em troca uma descarga de raio que o aprisiona na astronave extraterrestre. Diante de toda a literatura existente sobre os alienígenas como metáfora dos imigrantes, sente-se a tentação de interpretar a curiosa performance do prefeito como fruto de uma reavaliação do seu velho entusiasmo pela sociedade multiétnica e multi-religiosa. Quem entrega as chaves da cidade aos alienígenas sonhando poder conviver com eles sem problemas numa idílica harmonia acaba por tornar-se seu prisioneiro.
Em nome de Bento
Mas, ainda que fosse verdade, o sonho não teria substituído a realidade. Uma Europa Ocidental majoritariamente muçulmana constituiria, muito simplesmente, uma civilização diferente da que hoje conhecemos. Pode-se discutir se será bela ou feia: o que é certo é que não será mais a mesma. Como escreve Steyn: "É a demografia, estúpido, a única questão importante. A Europa no final do século será um continente depois da bomba de nêutron. As grandes construções ainda estarão lá, mas as pessoas que as fizeram terão desaparecido". Nesse meio tempo – e sob este ponto de vista o livro de Steyn é também divertido – os políticos europeus escondem os crucifixos e os presépios para não incomodar os muçulmanos, ou dedicam seu tempo (Steyn dá as provas, e assegura que infelizmente não se trata de brincadeira) a discutir se ensinar os homens europeus a urinar sentados e não em pé, com a conseqüente abolição dos mictórios, "último refúgio de um machismo patriarcal", não poderia contribuir para acentuar a igualdade entre homens e mulheres e a comprazer as feministas. O mesmo escritor atribui o suicídio demográfico à "falta de confiança na própria civilização". A meu ver, uma expressão mais precisa é aquela do Papa Bento XVI: "falta de esperança". Depois de haver perdido a virtude da fortaleza, a Europa perdeu também a esperança no futuro. A civilização que não espera não faz filhos: mas são exatamente as civilizações destinadas a desaparecer. O desaparecimento de Roma não significou o desaparecimento da melhor parte da sua herança: havia um São Bento para recolhê-la. Hoje, parece que só um outro homem chamado Bento se ergue entre a Europa e o seu suicídio anunciado por Steyn.
(Tradução de Miguel Nagib.)

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