Observador Isento (Unbiased Observer)

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Tuesday, April 21, 2009

Dia 13, sexta-feira

Luiz A. Góes

Filipe o Belo, o rei Filipe IV da França, era o que se podia chamar de um sujeito de sorte. Tudo lhe dava certo. Até o apelido que o marcou, porque era considerado um indivíduo extremamente bonito.
Era o segundo filho de Filipe III, mas se tornou herdeiro do trono porque seu irmïo mais velho morreu com 12 anos de idade. Escapou com vida quando, em 1285, o rei de Aragão, Pedro III, arrasou o exército francês mas poupou a família real, e assumiu o trono logo em seguida, devido à morte de seu pai, com apenas 17 anos de idade.
Criou uma organização burocrática eficiente que colocou a França no caminho da modernidade, acumulou o título de rei de Navarra por fôrça de seu casamento aos 16 anos com Joana I de Navarra, e com a morte desta anexou definitivamente a seus domínios territórios pertencentes à herança da esposa. Acrescentou a seus domínios, além disso, diversos outros territórios, mediante conquistas, permutas, ou aquisições em dinheiro, ampliando enormemente seu domínio e influência.
Filipe o Belo envolveu-se em numerosos conflitos, dentre os quais uma espécie de aliança com o Império Mongol contra os muçulmanos visando reconquistar a Terra Santa, - o que depois de várias reviravoltas foi abandonado, - e promoveu uma guerra contra a Inglaterra, esta também em busca de mais territórios na época, tendo ao final ficado com alguns territórios, devolvido outros e acabado resolvendo o conflito por meio do casamento de sua irmã mais nova com o rei da Inglaterra. Além de outros conflitos que lhe renderam mais territórios ou concessões comerciais importantes. Além da alcunha que já ostentava, Felipe o Belo ficou também conhecido como o Rei de Ferro pelas numerosas guerras em que se envolveu e venceu.
Mas o mais importante de todos os conflitos foi o que Filipe o Belo teve com o papado. Os territórios da Igreja eram, na época, extremamente importantes, e sua influência em toda a Europa era considerável.
Precisando de dinheiro para financiar suas guerras, Filipe o Belo começou por perseguir os judeus e confiscar os seus bens, expulsando-os do território francês, e em seguida confiscou os bens de banqueiros da Lombardia, no norte da atual Itália, bem como de numerosos abades, membros da Igreja que detinham recursos que emprestavam aos governantes. Além disso, criou impostos sôbre o clero, e com isso entrou definitivamente em conflito com o Papa Bonifácio VIII, o qual, entretanto, devido a outros problemas que enfrentava, acabou por ceder. Mas esse conflito não cessou aí, e representantes de Filipe o Belo acabaram por atacar fisicamente o Papa em um encontro diplomático, em consequência do qual veio a falacer um mês depois. Seu sucessor foi Bento XI, o qual morreu misteriosamente em pouco tempo, - dizem que foi envenenado. E com isso subiu ao trono papal Clemente V, de origem francesa, o qual concordou em transferir o papado de Roma para Avinhão, na França, passando assim a ficar sob integral influência de Filipe o Belo.
Com isso, a antiga proteção que o papado emprestava à Ordem dos Templários, remanescente das Cruzadas e formada por monges guerreiros, perdeu fôrça. Os Templários tinham se especializado em proteger a Terra Santa e também os peregrinos europeus que a visitavam, tendo acumulado grande riqueza em suas atividades nas Cruzadas e depois como banqueiros, tendo sido êles os inventores de transferência de valores sem que o dinheiro, na época geralmente em ouro, tivesse que ser transportado, eliminando assim um dos maióres riscos que as transações financeiras corriam na época, devido aos assaltantes, fossem êles bandidos ou governantes hostís: um depósito de dinheiro com os Templários na Europa (particularmente na França) era honrado na Terra Santa com a entrega de quantia correspondente ao destinatário por outros Templários que lá se encontravam, ou vice-versa, mediante o pagamento de uma taxa.
Derrotados na Terra Santa, os Templários continuaram com suas atividades na Europa, particularmente as atividades bancárias, tendo se tornado financiadores dos principais governantes europeus da época, uma vez que tinham amealhado considerável fortuna.
Filipe o Belo, prosseguindo em sua busca por recursos, obteve do Papa Clemente V concordância para extinguir a Ordem dos Templários, e no dia 13 de outubro de 1307 o grão mestre da Ordem, Jacques de Molnay, e grande número de seus integrantes, foi preso, ao mesmo tempo que todos os seus bens foram confiscados.
Filipe o Belo procedeu em seguida a julgamentos desses prisioneiros, tendo submetido todos a torturas, e finalizando por condená-los à morte na fogueira. Jacques de Molnay foi executado cêrca de sete anos depois de sua prisão, e de dentro das chamas amaldiçoou o rei Filipe IV e sua descendência até a décima geração, bem como o papa Clemente V e o ministro Guilherme de Nogaret, - êste último tendo sido o que esbofeteou o Papa Bonifácio VIII com a mão enluvada com a luva de sua armadura de ferro, - afirmando que êles seriam convocados perante o tribunal de Deus no prazo de um ano, e que os descendentes de Filipe o Belo teriam mortes violentas.

De fato, todos os três citados morreram em menos de um ano, e se sucederam 13 ou 14 monarcas, descendentes de Filipe o Belo, que morreram prematuramente em prazo relativamente curto, vários dos quais assassinados ou com mortes de alguma forma violenta, a ponto de extinguir-se a dinastia a que pertenciam. O próprio Felipe o Belo sofreu uma "apoplexia" (um derrame) cerebral que o inutizou de uma hora para outra. Seus três filhos subiram ao trono um após o outro e foram morrendo também em prazos bastante curtos. Chegou ao ponto de um recém-nascido ser proclamado rei, igualmente morrendo logo em seguida.
O dia 13 de outubro de 1307 era uma sexta-feira. A derrocada de Felipe o Belo, começou naquela sexta-feira 13, e a partir de então surgiu a idéia, que persiste até hoje, de que as sextas-ferias 13 são dias de mau agouro.
Estamos no momento assistindo a um fenômeno mais ou menos parecido com o caso de Felipe o Belo, quando um improvável sindicalista cuja biografia é marcada por tremenda sorte se tornou o mandatário máximo, detendo apôio popular sem precedentes e escapando de todos os escândalos que em condições normais já teriam derrubado qualquer governante, por mais forte e popular que fosse, em qualquer país do mundo. E esse improvável mandatário monta dispositivos destinados a perpetuar no poder a quem êle escolher, estabelecendo assim, à maneira tupiniquim, uma dinastia de governantes pouco prováveis mas que encontram pouca ou nenhuma resistência ou oposição a seus reprováveis métodos, à sua incompetência flagrante e à sua indisfarçável corrupção.
Quem sabe isso venha a acabar numa sexta-feira 13 com um grito de revolta de algum grão mestre corajoso…

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