Observador Isento (Unbiased Observer)

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Tuesday, April 03, 2007

Ufanismo

Luiz A. Góes
O homem tem uma ligação telúrica, emocionalmente profunda, com a terra em que nasce. Isso foi provado cientificamente, a ponto de ter consequência prática em muitas situações: os diplomatas, por exemplo, se cidadãos naturalizados, não podem servir em situações em que possam ter que decidir entre suas pátrias adotadas e suas pátrias originais, ou de nascimento. É um princípio de que nenhum país abre mão.
Sartre, em seu admirável "Reflexões Sôbre o Racismo", demonstrou que os escravos negros nas Américas sofriam mais por estarem longe de suas terras do que por serem escravos, e muitos retornaram à África quando a escravidão foi abolida: permaneceram os que não tiveram meios para partir, bem como aqueles que, já nascidos nas Américas, não sofriam do mesmo mal com tanta intensidade.
Na antiguidade registra-se o retôrno dos judeus à sua terra, embora fosse em pleno deserto, quando o persa Ciro conquistou a Babilônia e permitiu que partissem. Mas nem todos foram, porque já existiam gerações de judeus nascidos na Babilônia que preferiram lá ficar.
Essa ligação com a terra independe de a mesma ser boa ou ruim, de ter belezas ou não ter, de a vida nela ser boa ou não. É algo bastante inexplicável.
Quer dizer: todas as pessoas tendem a achar suas terras melhores do que todas as outras, e delas só sáem quando obrigados (que foi o meu caso, por razões profissionais), - e para elas voltam sempre que podem. (No meu caso, divido o tempo, porque tenho filhos nos EUA e no Brasil, e agora tenho um neto que se encontra no Brasil.) E todos tendem a achar que suas terras têm belezas, maravilhas, coisas boas, são melhores do que todas as outras.
Por outro lado, há belezas, maravilhas, coisas boas espalhadas pelo mundo todo, mas há também coisas ruins, negativas, no mundo todo, sem qualquer exceção. E não existe povo honesto, disciplinado, cumpridor da lei e dos deveres por natureza: o que existe são bons sistemas de contrôle e punição, que fazem toda a diferença entre a órdem e a desordem.
Assim, o ufanismo é uma coisa mais ou menos natural para todos no mundo todo. O que acontece no Brasil é que a exacerbação do ufanismo tem prejudicado o país mais do que beneficiado, porque implica num conformismo sutilmente inculcado nas mentes das pessoas.
Êste assunto é bastante instigante e vasto, mas não pretendo mais voltar a abordá-lo, até mesmo porque parece haver muita gente que entende mais de "patriotismo americano", ou da "ignorância dos americanos" do que de qualquer outra coisa, uma mistura de ufanismo com anti-americanismo, e isso eu não pretendo discutir – até mesmo porque não me parece que tenha sentido. Observo que se se pudesse falar dos problemas do Brasil sem ter que ficar invocando esse tipo de comparação para nos auto-afirmarmos como superiores, seria muito melhor, muito mais útil, para o país e para seus cidadãos, particularmente para aqueles que se preocupam com os problemas e não renunciaram a usar as suas próprias cabeças para pensar.

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