Dois cariocas estrangeiros
Luiz A. Góes
O primeiro chefe que tive, o chefão do escritório de engenharia em que comecei a trabalhar quando tinha treze anos de idade, era um inglês mais carioca do que todos os cariocas que já conheci. Morava em São Paulo contrariado, obrigado ao sacrifício porque quase todos os contratos importantes do escritório naquela época eram com firmas ou instituições de São Paulo.
Era um tipo curioso em muitos aspectos, a começar pela estatura, - quase uns dois metros, - pelo fato de falar de maneira esparramada e bonachona um carioquês com leve sotaque britânico, pelo eterno senso de humor e otimismo de atitude, e por sempre responder, quando alguém perguntava como ia, com a mesma frase: "Graças a Deus vou mal" (êle tinha problemas com a coluna, que lhe causava dores e outros incômodos - coisa comum em gente alta, como vim a aprender com os anos).
Acho que, quando dizia aquilo, todos logo pensavam no tal problema e mudavam de assunto, mas um dia alguém retrucou: "Porquê graças a Deus, se vai mal?", ao que êle respondeu: "É porque poderia ser muito piór…" Até nisso se manifestava o bom humor e o otimismo que o caracterizavam.
Aquele carioca inglês me contratou, com treze anos de idade, como desenhista, fiando-se apenas na palavra daquele que eu considerava meu professor de desenho e pintura naquela época, sem jamais ter visto nada do que eu tinha feito ou sabia fazer. Foi extremamente amistoso e simpático quando me entrevistou, inclusive me dizendo que eu não precisava ficar nervoso, porque seguramente estava. Lembro-me de êle ter dito: "Não se preocupe, porque eu não como gente, meu rapaz!"
Pena que o perdi de vista: ao fim e ao cabo os contratos foram terminando, êle voltou a residir no Rio de Janeiro e eu acabei sendo demitido. (Parece que com o tempo todos foram, até mesmo um sobrinho do chefão que trabalhava lá e que vim a reencontrar mais tarde em outra empresa.) Mas não há dúvida que aquele período em que trabalhei naquele escritório foi o que me colocou no caminho da engenharia, que veio a ser a minha principal ocupação profissional durante toda a vida.
Os anos passaram e eu me lembrava periodicamente daquela figura, - aquele carioca estrangeiro, - como sempre desde que o conheci, até que um outro tipo me fêz voltar a pensar nele com maiór intensidade. Esse outro, ainda mais marcante, por coincidência também se considerava carioca embora fosse estrangeiro.
Conheci-o quando fui visitar a família de minha mulher, ainda antes de me casar. Chegando lá no interior, meu futuro sogro me apresentou aquele amigo que avaliei já bastante idoso, sem cabelos na cabeça a não ser umas penugens nos lados e atraz, vestido de maneira inusitada para o calor daquelas paragens, - de gravata e paletó o tempo todo, se bem que de linho, calçando umas botinas muito bem engraxadas - e falando com um sotaque português bastante carregado. Meu sogro também era português e conservava seu belo sotaque, mas bem mais amaciado pela longa convivência com sua esposa e filhas.
Seu Guilherme, - assim se chamava o amigo, - foi logo tratando de me crivar de perguntas, e tanto queria saber a meu respeito quanto falava de si próprio e de pessoas que fui compreendendo serem seus parentes, notadamente dois de seus filhos. Mas era uma situação curiosa, porque ninguém me explicou exatamente como era aquela amizade, tendo em conta que o Seu Guilherme era bem mais velho do que o meu futuro sogro. Na conversa disse-me que tinha setenta e cinco anos, - talvêz tivesse mesmo, mas parecia ter mais - e que tencionava ir à fazenda para andar a cavalo, entre muitas outras coisas que me pareceram puras bravatas. Mas depois vi meu sogro comentando que precisava dar um jeito de fazer com que o Seu Guilherme desistisse da idéia, porque se êle viesse a cair do cavalo, ou tivesse qualquer outro tipo de acidente, seria um problema daquele tamanho, - e não era difícil de acontecer.
Sempre que perguntado como ia, Seu Guilherme respondia com a mesma frase: "Por milagre ainda estou vivo". E sempre explicava, face à inevitável surpresa do interlocutor, que era um verdadeiro milagre ter chegado àquela idade, com tantos perigos, doenças, ameaças e coisas que tais sempre ao redor.
Sua maneira de dizer tudo o que lhe vinha à cabeça fazia dele uma pessoa interessante e por vêzes um pouco desconfortante, sempre pensando em voz alta, o que êle compensava com sua grande simpatia.
Arranjando coisas para fazer com o amigo, meu sogro o levava a visitar seus amigos e conhecidos, particularmente aqueles também de origem portuguesa, e era engraçado ver aqueles homens de meia idade ou avançados em anos se lembrando de coisas curiosas da terrinha e trocando reminiscências. Pelas observações e reações do Seu Guilherme, podia-se ver que se tratava de pessoa experiente em negócios. Fazia perguntas sem fim aos visitados sôbre suas atividades, perguntava de maneira muito direta se os negócios estavam dando lucro, dava palpites sobre tudo o que via, às vêzes causando um certo incômodo aos interlocutores.
Numa dessas visitas, o visitado, amigo de meu sogro que tinha uma distribuidora de bebidas, resolveu lá para as tantas devolver as perguntas, e começou: "Qual é o seu ramo?", e o Seu Guilherme respondeu, sem pestanejar e deixando todo mundo mudo: "Eu sou agióta, homem…" Naquela idade, era evidente que devia viver de alguma renda, mas a franqueza foi desconcertante.
Aos poucos fui sabendo mais sobre aquela figura ímpar: era pai de um amigo de meu sogro que vivia em Portugal, - e a quem vim a conhecer anos mais tarde. Na festa de meu casamento Seu Guilherme havia lá estado, muito ativo e falante, aparecendo em grande número de fotos que foram muito comentadas por seu filho, esposa e netos.
Um belo dia, já casado e estando minha filha mais velha com uns dois anos ou mais, abro a porta de casa ao chegar do trabalho e dou de cara com o Seu Guilherme, muito sorridente, sentado no sofá de nossa sala de visitas lá em Santos. A seu lado estava uma senhora bastante idosa e também muito sorridente, que vi logo ser carioca da gema pelo sotaque especialíssimo, pessoa de uma simpatia infinita e lucidez ainda maior do que a do Seu Guilherme. Era uma velhinha surpreendente inclusive na maneira de se vestir: parecia estar no começo do século (o XX), com um vestido escuro algo longo de gola de babado de crochê branca, um chapéuzinho com um véu protegendo parcialmente o rosto, luvas na mão, uma sombrinha de estilo antigo mais ou menos da mesma cor do vestido, e outros detalhes que me escaparam mas que minha mulher depois se encarregou de lembrar.
Novamente Seu Guilherme respondeu com a frase "Por milagre ainda estou vivo" quando perguntei como estava, e depois na conversa isso foi ainda muito mais evidenciado. E foi logo apresentando a velhinha simpática: "Apresento minha esposa…"
Fiquei meio sem ação, surpreendido com a cena e a situação, até mesmo porque eu nunca havia pensado naquele lado de sua vida, mas a verve dos dois não permitiu que o meu espanto continuasse por mais do que alguns poucos segundos. A senhora, cujo nome não guardei, era tão falante quanto o Seu Guilherme, e os dois pareciam felizes da vida. Contaram que dias antes, lá no Rio onde moravam, haviam sido abordados por assaltantes a mão armada, dois sujeitos com revólveres que lhes exigiram a carteira, o relógio, as jóias e tudo o mais, mas a senhora reagiu a sombrinhadas. Os dois sujeitos começaram a dar tiros, mas por sorte não os atingiram e se mandaram sem nada levarem. "É mesmo um milagre", repetia o Seu Guilherme.
A conversa ficou bem descontraída e a senhora disse, em certo momento, que conhecia Seu Guilherme havia cinquenta anos, sem mencionar por quanto tempo estavam casados. Por sua vêz Seu Guilherme comentou que ela conhecia a maior parte de sua vida, porque estava com setenta e cinco anos… Ainda?, pensei, - êle continuou a ter setenta e cinco anos até que o perdi completamente de vista anos depois.
A coisa ficou mais clara depois que vim a saber melhor da história da família: Seu Guilherme havia ido para o Brasil com a mulher, e pouco depois fêz com que seus dois filhos e respectivas esposas o seguissem. E assim meu sogro se tornou amigo íntimo de um deles. Nem a mulher de Seu Guilherme e nem os seus filhos e esposas se acostumaram no Brasil e decidiram voltar para Portugal, mas Seu Guilherme deixou-se ficar no Rio de Janeiro. Pela correspondência de meu sogro com o amigo português ficamos sabendo que a esposa de Seu Guilherme, da qual estava separado em têrmos práticos havia várias décadas, falecera em Portugal, de modo que ficou muito fácil entender que o Seu Guilherme, com "setenta e cinco anos", estava recém casado em segundas núpcias, seguramente com a pessoa que havia tomado conta dele durante todo aquele tempo. Com um pouquinho de imaginação isso poderia dar uma história de amor digna de um filme.
Mas só então deciframos o significado da visita de Seu Guilherme com a esposa: foi a maneira de êle anunciar a seus descendentes que havia se casado de novo, pelo jeito depois de esperar bem uns cinquenta anos para ter condições legais para tanto. Isso ficou ainda mais evidente quando contamos aos meus sogros sobre a visita: a curiosidade a respeito da velhinha simpática foi grande, e era evidente que aquilo foi parte importante dos relatos epistolares subsequentes. E êle tinha escolhido justamente a nós para sermos os repórteres involuntários de sua história mais recente.
Cumprido o objetivo da visita, Seu Guilherme como que se transformou numa série de notícias através de meu sogro de tempos em tempos, porque quase não mais o vimos. Parece ter se esvaido no tempo e no espaço, deixando atraz de si apenas aquela sua inesquecível onda de simpatia.
Nunca me esqueci e nem me esquecerei desses dois cariocas que eram estrangeiros, cada um tendo marcado profundamente minha vida à sua maneira.
O primeiro chefe que tive, o chefão do escritório de engenharia em que comecei a trabalhar quando tinha treze anos de idade, era um inglês mais carioca do que todos os cariocas que já conheci. Morava em São Paulo contrariado, obrigado ao sacrifício porque quase todos os contratos importantes do escritório naquela época eram com firmas ou instituições de São Paulo.
Era um tipo curioso em muitos aspectos, a começar pela estatura, - quase uns dois metros, - pelo fato de falar de maneira esparramada e bonachona um carioquês com leve sotaque britânico, pelo eterno senso de humor e otimismo de atitude, e por sempre responder, quando alguém perguntava como ia, com a mesma frase: "Graças a Deus vou mal" (êle tinha problemas com a coluna, que lhe causava dores e outros incômodos - coisa comum em gente alta, como vim a aprender com os anos).
Acho que, quando dizia aquilo, todos logo pensavam no tal problema e mudavam de assunto, mas um dia alguém retrucou: "Porquê graças a Deus, se vai mal?", ao que êle respondeu: "É porque poderia ser muito piór…" Até nisso se manifestava o bom humor e o otimismo que o caracterizavam.
Aquele carioca inglês me contratou, com treze anos de idade, como desenhista, fiando-se apenas na palavra daquele que eu considerava meu professor de desenho e pintura naquela época, sem jamais ter visto nada do que eu tinha feito ou sabia fazer. Foi extremamente amistoso e simpático quando me entrevistou, inclusive me dizendo que eu não precisava ficar nervoso, porque seguramente estava. Lembro-me de êle ter dito: "Não se preocupe, porque eu não como gente, meu rapaz!"
Pena que o perdi de vista: ao fim e ao cabo os contratos foram terminando, êle voltou a residir no Rio de Janeiro e eu acabei sendo demitido. (Parece que com o tempo todos foram, até mesmo um sobrinho do chefão que trabalhava lá e que vim a reencontrar mais tarde em outra empresa.) Mas não há dúvida que aquele período em que trabalhei naquele escritório foi o que me colocou no caminho da engenharia, que veio a ser a minha principal ocupação profissional durante toda a vida.
Os anos passaram e eu me lembrava periodicamente daquela figura, - aquele carioca estrangeiro, - como sempre desde que o conheci, até que um outro tipo me fêz voltar a pensar nele com maiór intensidade. Esse outro, ainda mais marcante, por coincidência também se considerava carioca embora fosse estrangeiro.
Conheci-o quando fui visitar a família de minha mulher, ainda antes de me casar. Chegando lá no interior, meu futuro sogro me apresentou aquele amigo que avaliei já bastante idoso, sem cabelos na cabeça a não ser umas penugens nos lados e atraz, vestido de maneira inusitada para o calor daquelas paragens, - de gravata e paletó o tempo todo, se bem que de linho, calçando umas botinas muito bem engraxadas - e falando com um sotaque português bastante carregado. Meu sogro também era português e conservava seu belo sotaque, mas bem mais amaciado pela longa convivência com sua esposa e filhas.
Seu Guilherme, - assim se chamava o amigo, - foi logo tratando de me crivar de perguntas, e tanto queria saber a meu respeito quanto falava de si próprio e de pessoas que fui compreendendo serem seus parentes, notadamente dois de seus filhos. Mas era uma situação curiosa, porque ninguém me explicou exatamente como era aquela amizade, tendo em conta que o Seu Guilherme era bem mais velho do que o meu futuro sogro. Na conversa disse-me que tinha setenta e cinco anos, - talvêz tivesse mesmo, mas parecia ter mais - e que tencionava ir à fazenda para andar a cavalo, entre muitas outras coisas que me pareceram puras bravatas. Mas depois vi meu sogro comentando que precisava dar um jeito de fazer com que o Seu Guilherme desistisse da idéia, porque se êle viesse a cair do cavalo, ou tivesse qualquer outro tipo de acidente, seria um problema daquele tamanho, - e não era difícil de acontecer.
Sempre que perguntado como ia, Seu Guilherme respondia com a mesma frase: "Por milagre ainda estou vivo". E sempre explicava, face à inevitável surpresa do interlocutor, que era um verdadeiro milagre ter chegado àquela idade, com tantos perigos, doenças, ameaças e coisas que tais sempre ao redor.
Sua maneira de dizer tudo o que lhe vinha à cabeça fazia dele uma pessoa interessante e por vêzes um pouco desconfortante, sempre pensando em voz alta, o que êle compensava com sua grande simpatia.
Arranjando coisas para fazer com o amigo, meu sogro o levava a visitar seus amigos e conhecidos, particularmente aqueles também de origem portuguesa, e era engraçado ver aqueles homens de meia idade ou avançados em anos se lembrando de coisas curiosas da terrinha e trocando reminiscências. Pelas observações e reações do Seu Guilherme, podia-se ver que se tratava de pessoa experiente em negócios. Fazia perguntas sem fim aos visitados sôbre suas atividades, perguntava de maneira muito direta se os negócios estavam dando lucro, dava palpites sobre tudo o que via, às vêzes causando um certo incômodo aos interlocutores.
Numa dessas visitas, o visitado, amigo de meu sogro que tinha uma distribuidora de bebidas, resolveu lá para as tantas devolver as perguntas, e começou: "Qual é o seu ramo?", e o Seu Guilherme respondeu, sem pestanejar e deixando todo mundo mudo: "Eu sou agióta, homem…" Naquela idade, era evidente que devia viver de alguma renda, mas a franqueza foi desconcertante.
Aos poucos fui sabendo mais sobre aquela figura ímpar: era pai de um amigo de meu sogro que vivia em Portugal, - e a quem vim a conhecer anos mais tarde. Na festa de meu casamento Seu Guilherme havia lá estado, muito ativo e falante, aparecendo em grande número de fotos que foram muito comentadas por seu filho, esposa e netos.
Um belo dia, já casado e estando minha filha mais velha com uns dois anos ou mais, abro a porta de casa ao chegar do trabalho e dou de cara com o Seu Guilherme, muito sorridente, sentado no sofá de nossa sala de visitas lá em Santos. A seu lado estava uma senhora bastante idosa e também muito sorridente, que vi logo ser carioca da gema pelo sotaque especialíssimo, pessoa de uma simpatia infinita e lucidez ainda maior do que a do Seu Guilherme. Era uma velhinha surpreendente inclusive na maneira de se vestir: parecia estar no começo do século (o XX), com um vestido escuro algo longo de gola de babado de crochê branca, um chapéuzinho com um véu protegendo parcialmente o rosto, luvas na mão, uma sombrinha de estilo antigo mais ou menos da mesma cor do vestido, e outros detalhes que me escaparam mas que minha mulher depois se encarregou de lembrar.
Novamente Seu Guilherme respondeu com a frase "Por milagre ainda estou vivo" quando perguntei como estava, e depois na conversa isso foi ainda muito mais evidenciado. E foi logo apresentando a velhinha simpática: "Apresento minha esposa…"
Fiquei meio sem ação, surpreendido com a cena e a situação, até mesmo porque eu nunca havia pensado naquele lado de sua vida, mas a verve dos dois não permitiu que o meu espanto continuasse por mais do que alguns poucos segundos. A senhora, cujo nome não guardei, era tão falante quanto o Seu Guilherme, e os dois pareciam felizes da vida. Contaram que dias antes, lá no Rio onde moravam, haviam sido abordados por assaltantes a mão armada, dois sujeitos com revólveres que lhes exigiram a carteira, o relógio, as jóias e tudo o mais, mas a senhora reagiu a sombrinhadas. Os dois sujeitos começaram a dar tiros, mas por sorte não os atingiram e se mandaram sem nada levarem. "É mesmo um milagre", repetia o Seu Guilherme.
A conversa ficou bem descontraída e a senhora disse, em certo momento, que conhecia Seu Guilherme havia cinquenta anos, sem mencionar por quanto tempo estavam casados. Por sua vêz Seu Guilherme comentou que ela conhecia a maior parte de sua vida, porque estava com setenta e cinco anos… Ainda?, pensei, - êle continuou a ter setenta e cinco anos até que o perdi completamente de vista anos depois.
A coisa ficou mais clara depois que vim a saber melhor da história da família: Seu Guilherme havia ido para o Brasil com a mulher, e pouco depois fêz com que seus dois filhos e respectivas esposas o seguissem. E assim meu sogro se tornou amigo íntimo de um deles. Nem a mulher de Seu Guilherme e nem os seus filhos e esposas se acostumaram no Brasil e decidiram voltar para Portugal, mas Seu Guilherme deixou-se ficar no Rio de Janeiro. Pela correspondência de meu sogro com o amigo português ficamos sabendo que a esposa de Seu Guilherme, da qual estava separado em têrmos práticos havia várias décadas, falecera em Portugal, de modo que ficou muito fácil entender que o Seu Guilherme, com "setenta e cinco anos", estava recém casado em segundas núpcias, seguramente com a pessoa que havia tomado conta dele durante todo aquele tempo. Com um pouquinho de imaginação isso poderia dar uma história de amor digna de um filme.
Mas só então deciframos o significado da visita de Seu Guilherme com a esposa: foi a maneira de êle anunciar a seus descendentes que havia se casado de novo, pelo jeito depois de esperar bem uns cinquenta anos para ter condições legais para tanto. Isso ficou ainda mais evidente quando contamos aos meus sogros sobre a visita: a curiosidade a respeito da velhinha simpática foi grande, e era evidente que aquilo foi parte importante dos relatos epistolares subsequentes. E êle tinha escolhido justamente a nós para sermos os repórteres involuntários de sua história mais recente.
Cumprido o objetivo da visita, Seu Guilherme como que se transformou numa série de notícias através de meu sogro de tempos em tempos, porque quase não mais o vimos. Parece ter se esvaido no tempo e no espaço, deixando atraz de si apenas aquela sua inesquecível onda de simpatia.
Nunca me esqueci e nem me esquecerei desses dois cariocas que eram estrangeiros, cada um tendo marcado profundamente minha vida à sua maneira.
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