Observador Isento (Unbiased Observer)

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Wednesday, May 20, 2009

Regredimos vinte séculos!

Luiz A. Góes

Na antiga Roma, já bem antes do nascimento de Cristo, os governantes, fossem êles chamados de cônsules, imperadores ou portassem qualquer outro título, davam à população o velho pão e circo como forma de mantê-la calma, contente e sobretudo sem ânimo para contestar ou discutir seus atos e decisões, limitando-se apenas a aplaudí-los.
Quando não havia circo, ou seja, espetáculos a oferecer, inventava-se-os. E quando ocorriam problemas que os governantes tinham dificuldade em resolver, criava-se logo a figura de algum bode expiatório. Houve vários deles, geralmente inimigos capturados que eram sacrificados em sangrentos espetáculos circenses, e dentre êles os cristãos, que no tempo de Nero foram identificados como arruaceiros e causadores de todos os problemas. Desde os últimos anos do reinado de Augusto, durante o qual Cristo nasceu, os cronistas já apontavam os tais "cristãos" como arruaceiros em Roma, mas foi sob Nero que êles passaram a ser ativamente perseguidos e colocados nas arenas para serem comidos por feras e coisas do gênero.
Mas circo apenas não era suficiente: havia a necessidade de manter a população de Roma de estômago cheio, e isso era feito distribuindo comida (grãos) e outros produtos, além de dinheiro: os governantes romanos tinham descoberto a fórmula mágica do poder. Seus exércitos conquistavam e submetiam povos a toda volta, na Europa, no Oriente Médio e no norte da África, e deles cobravam tributos. Geralmente esses tributos eram pagos sob a forma de grãos ou outros produtos de que Roma necessitava, de modo que os romanos foram aos poucos se tornando emaciados, vagabundos, preguiçosos, embora ameaçassem o poder do governante de plantão quando tinham fome.
Assim, o destino de Roma era expandir indefinidamente o império e manter um fluxo constante ou crescente de tributos pagos pelos povos dominados, além de produzir escravos sem conta para fazerem os trabalhos que os romanos iam se achando importantes demais para fazerem. Júlio César subiu ao poder depois de extensas campanhas de conquista com essa finalidade, e o fêz participando de um triunvirato (o Primeiro Triunvirato), para em seguida eliminar seus dois pares e se tornar imperador absoluto. Assassinado, formou-se outro triunvirato (o Segundo Triunvirato), do qual participavam seu sobrinho, protegido e herdeiro Otavio (que depois adotou o nome de Augusto) e seu general e amigo mais chegado Marco Antonio. Logo êstes dois se livraram de Lépido, terceiro membro do triunvirato, e Otávio deu um jeito de mandar Marco Antonio para o Egito, onde êste último, repetindo Júlio César, envolveu-se com a rainha Cleópatra, descendente de Ptolomeu, o faraó grego lá instalado séculos antes por Alexandre da Macedonia.
Foi a negativa de Marco Antonio de fornecer o trigo de que Otávio necessitava para manter os romanos submissos a seus desejos de domínio que fêz com que Otávio desencadeasse uma intensa campanha política e bélica contra Marco Antonio, a qual resultou nas mortes deste, de Cleópatra e do pequeno Cesarion, filho de Júlio César e Cleópatra, que Otávio temia poder vir a reivindicar o trono de Roma.
Cito esses acontecimentos para mostrar como a bolsa-esmola ou a cesta básica de então, ou seja, os grãos para manter o povo romano de estômago cheio e boca calada, já era importante naquela época. Com algumas modificações, não era muito diferente o sistema vigente no antigo Egito dos faraós, embora os egípcios sempre tivessem tido que trabalhar para sobreviver.
O tempo passou e a doação da cesta básica ou da bolsa-esmola desapareceu e reapareceu com outras feições, ao longo dos séculos, em numerosos lugares do mundo por curtos períodos. Passou a ser o sistema usado para socorrer populações submetidas a calamidades como desastres naturais (sêcas, enchentes) ou não (guerras, dominações), mas parecia extinto como sistema apenas para obtenção e manutenção do poder, como na antiga Roma.
Quer dizer: parece que regredimos bem uns dois milênios, ou vinte séculos, porque aquele sistema foi ressuscitado e se tornou peça-chave do sistema de poder brasileiro. Criado e pensado para ser um sistema de incentivo à educação, a fim de elevar o nível geral da população e assim melhorar seu padrão de vida, gerando iniciativas, criatividade, emprêgos, acabou sendo transformado num sistema de pão e circo ao mais puro estilo romano antigo: realizar copas do mundo, olimpíadas, jogos panamericanos e quetais dentro das fronteiras, ao mesmo tempo que se estimula a adesão ao sistema da bolsa-esmola e da cesta básica grátis, sem qualquer contrapartida em têrmos de melhora de nível ou de trabalho, é tudo o que querem garantir os governantes de plantão, - quando não estão diretamente ocupados com atividades eleitorais ou eleitoreiras de outros tipos. Tudo o mais são meros acessórios. E tudo muito facilitado pela existência de uma classe de "escravos" que paga altíssimos impostos para sustentar esse sistema macabro.
Pensando bem, esse mandatário que diz ter criado o maiór programa de distribuição de renda de todos os tempos está bem atrasado: não inventou nada, é coisa muitíssimo velha. Apenas está fazendo regredirmos vinte séculos pelo menos.

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