Observador Isento (Unbiased Observer)

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Tuesday, August 05, 2008

E a Varig não?

Luiz A. Góes

Li e reli um artigo do Clarín, de Buenos Aires, publicado em 04/08/08, juntamente com outro artigo publicado na mesma página do Clarín, o qual também me pareceu pertinente, os quais podem ser lidos pelos interessados no endereço http://www.clarin.com/diario/2008/08/04/elpais/p-01729488.htm .
Ultimamente parece que se tornou importante ler jornais estrangeiros, particularmente os dos "hermanos", os quais revelam coisas que a imprensa brasileira deixa de publicar, - um outro exemplo importante é o da revista colombiana Cambio sôbre o Brasil e as Farc, recentemente publicado, - coisas essas seguramente de grande interêsse para os brasileiros conscientes de seus direitos e deveres e, sobretudo, pagadores dos impostos que sustentam essas "coisas".
O assunto do artigo do Clarín, que tem por título "Aviones, un vehículo militar y obra pública, en la agenda empresarial", e mais o outro texto na mesma página sob título "Argentina intentará exportarles más", me pareceu demasiado importante para passar em branco, de modo que resolvi resumir alguns aspectos dessas questões (porque são várias) para levantar reflexões.
O artigo do Clarín menciona os seguintes pontos que me eram desconhecidos:
a) a ajuda do Brasil à Argentina para manter no ar a Aerolíneas Argentinas: trata-se, como noticiado no artigo, de um plano para a Embraer vender aviões à Aerolíneas por meio de financiamento do BNDES;
b) o plano para fabricação de um veículo militar desenvolvido conjuntamente pelos exércitos brasileiro e argentino, o "Gaucho";
c) a participação em curso de empresas brasileiras em obras públicas na Argentina e outras participações brasileiras naquele país, fazendo do Brasil o principal investidor na Argentina atualmente.
Acho que não há nada de errado em financiar as vendas de empresas brasileiras para o exterior: é uma forma de fomento que outros países também praticam, podendo-se citar como exemplos conhecidos de longa data o Eximbank, dos EUA, e o seu equivalente canadense, ambos estatais. Esses financiamentos produzem emprêgos e renda, sempre que as atividades até o momento da exportação sejam desenvolvidas dentro das fronteiras brasileiras.
Já nos financiamentos destinados a possibilitar que empresas brasileiras executem contratos nos países de destino a coisa muda muito de figura, porque êles geram emprêgos e renda nesses países, que são ao mesmo tempo os recipientes dos financiamentos, e nada geram para o Brasil, a não ser o lucro que as empresas brasileiras executantes venham a auferir, além de gerarem impostos recolhidos pelos países recipientes. Isso se aplica não só ao caso da Argentina, mas também a todos os demais em curso ou projetados, na Bolívia, na Venezuela, etc.
Em todos esses casos há a considerar mais dois aspectos: usar o BNDES para esses financiamentos significa transformar o BNDES, em grande parte, em banco de desenvolvimento econômico e social dos países vizinhos, e me parece que isso estaria fora dos objetivos do BNDES, a menos que tenham mudado completamente os fundamentos de sua definição inicial. De qualquer maneira ficaria talvez mais adequado fazer essas operações através de banco cujos objetivos incluam ou sejam definidos como de fomento a exportações.
O segundo aspecto é o das garantias necessárias a esse tipo de operação: vimos recentemente a Bolívia apoderar-se de instalações da Petrobrás e de ignorar tratados que levaram à construção do gasoduto para possibilitar o consumo do gás boliviano pelos brasileiros sem que o Brasil tenha reagido a não ser aceitando o golpe de mão e ainda mais concordando em continuar a "investir" naquele país de diversas maneiras. É claro que todos esses "investimentos" são "a fundo perdido", porque jamais serão ressarcidos: o tomador já demonstrou de maneira extremamente clara sua real natureza de "tomador" no sentido mais pleno do têrmo.
No caso da Aerolíneas Argentinas, trata-se de uma empresa falida: quem será o garantidor? O govêrno argentino? É preciso lembrar que os negócios no Mercosul sempre andam bem quando favoráveis aos argentinos, mas encrencam quando favoráveis aos brasileiros. E aqui me refiro ao outro artigo que encontrei na mesma página do Clarín: êle se refere às dificuldades que vem tendo a Argentina para exportar para o Brasil, entre outras coisas. Se tem dificuldade para vender para o Brasil, fica difícil para o Brasil considerar boa a garantia que a Argentina possa lhe oferecer, - não é mesmo?. Serão, mais uma vez, "investimentos a fundo perdido"? Será por isso que o Brasil se tornou o principal "investidor" externo na Argentina atualmente?
E se vai aceitar a garantia do govêrno argentino à Aerolíneas, porque não amparou a Varig, - estatizando-a temporariamente, por exemplo, - em lugar de deixar que fosse à matroca? Não teria feito muito mais sentido e sido muito mais garantido?
A outra coisa que me chamou a atenção foi o tal de "Gaucho", um veículo militar desenvolvido em conjunto pelos exércitos dos dois países: o Brasil já teve um fabricante de veículos militares com tecnologia própria que experimentou, inclusive, grande sucesso internacional, tendo exportado grandes números daqueles veículos para diversos países. Essa necessidade de desenvolver um veículo militar em conjunto com o exército argentino me parece, portanto, meio fora de propósito, mas seriam necessárias mais informações sôbre o assunto para se poder tecer quaisquer comentários objetivos sôbre o mesmo.
E, "last but not least", um comentário sôbre a comitiva de empresários brasileiros, presidida pelo Eugenio Staub, o da Gradiente, cuja dívida pública pode ter provocado a queda do Jorge Rachid da Receita Federal. Não é realmente incrível como todas essas coisas se entrelaçam? Difícil de entender, não é mesmo? Talvez nem tanto, embora eu não tenha nenhuma esperança de chegar a isso.