Observador Isento (Unbiased Observer)

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Wednesday, August 12, 2009

Uma grande diferença

Luiz A. Góes

Quem já viveu sob forte inflação e vive atualmente sob um regime de moeda controlada, ou vice-versa, sabe perfeitamente que existe uma grande diferença entre as duas situações, mas a grande maioria das pessoas não conhece uma explicação simples para isso, ou não conhece nenhuma explicação para essa diferença. Trata-se, evidentemente, de assunto bastante complexo, mas há alguns pontos tão importantes que se sobrepõem a todos os outros, como que respondendo pela esmagadora maioria das diferenças entre as duas situações. Explicados esses pontos, o "economês" passa a ser um pouco mais inteligível para quem, como nós, não é especialista no assunto.

Dois desses pontos são o comportamento dos compradores em cada uma das duas situações, e o comportamento dos produtores em cada uma delas, tudo girando em torno do problema dos preços, de sua formação e evolução sob regime fortemente inflacionário e sob regime de moeda estável.

Sob forte inflação, a estratégia do comprador é sempre comprar o que precisa, ou vai precisar amanhã ou daqui a uma semana, ou um mês, o mais depressa possível, porque os preços aumentam dia a dia sem parar, e adiar uma compra pode representar graves prejuizos. Um conceito popular muito conhecido, quando há inflação elevada, é que guardar dinheiro é o mesmo que guardar gelo: num instante o dinheiro passa a valer nada, "derrete como gelo".

Quem tem muito dinheiro sempre encontra formas de se proteger, mesmo numa situação inflacionária, e até a ganhar com ela, atuando no mercado financeiro. Quem tem pouco dinheiro geralmente não pode fazer isso, seja porque desconhece as técnicas necessárias, porque não dispõe dos contactos e informações necessários, porque não pode aguardar os prazos envolvidos no caso de precisar do dinheiro para alguma emergência, etc, etc. Quer dizer: o cidadão comum, que não é abastado, praticamente tem apenas uma forma de se proteger contra a inflação: transformar imediatamente todo o dinheiro que recebe em mercadorias.

O produtor, por seu turno, sabe que numa situação de inflação elevada os compradores de seus produtos não terão muito tempo para ficar analisando os preços dos diversos produtores ou ofertantes, mesmo porque todos os produtores estarão pensando isso mesmo: que para os compradores fica mais importante comprar rapidamente do que procurar mercadorias com preços mais baixos.

Assim, sob forte inflação o produtor calcula o seu custo e a êle acrescenta o seu lucro, dando como resultado o preço, sem preocupação quanto a ser o custo alto ou baixo, porque o comprador vai ter que comprar rapidamente e sem analisar muito. Prevalece então a equação preço = custo + lucro. Simplesmente, o preço é imposto pelo produtor.

Quando a moeda é estável, ao contrário, o comprador pode escolher o melhor momento para comprar sem ter que se preocupar com alterações repentinas de preços, e assim tem tempo para estudar melhor os preços ofertados e comprar o que lhe for mais econômico. Prevalece então a equação lucro = preço de mercado - custo. O preço é estabelecido pelo mercado, em função de numerosos fatores dentre os quais se destaca o quanto os compradores estão dispostos a pagar, além de serem altamente influenciados pelo custo apurado pelo produtor mais eficiente, - o que tende a puxar o preço de mercado para baixo, - e a única forma de um produtor garantir que o seu lucro não acabe sendo negativo, ou seja, que não tenha prejuizo, será efetuando um rigoroso contrôle de seu custo, reduzindo-o tanto quanto possível.

A diferença entre as duas equações acima citadas é abismal, e vale repetir: na primeira é o produtor que determina o preço, enquanto que na segunda o preço é determinado pelo mercado, ou seja: na primeira o preço é quanto o produtor quer cobrar, e na segunda o preço é quanto o mercado quer pagar.

Na primeira situação, o que interessa ao produtor, mais do que o custo, é a velocidade com que produz e vende. Além de castigar os compradores impondo-lhes preços mais altos, o produtor contribue, com essa prática, para fazer com que a inflação se acelere ainda mais. Trata-se de uma verdadeira armadilha tanto para o produtor quanto para o comprador, ou consumidor, porque o que acontece é que se instala uma espiral inflacionária sem saída possível, frequentemente resultando em problemas sociais e políticos de extrema gravidade.

Não é difícil perceber-se a importância que o contrôle da inflação e do valor do dinheiro tem para a saúde da economia e do ambiente social, sendo desnecessário enfatizar que a manutenção de uma moeda estável tanto quanto possível tem que ser sempre prioridade absoluta de qualquer govêrno, por mais ideológico que seja. Qualquer posicionamento diferente é sempre pura enganação.