Observador Isento (Unbiased Observer)

A space for rational, civilized, non-dogmatic discussion of all important subjects of the moment. - Um espaço para discussão racional, civilizada, não dogmática de todos os assuntos importantes do momento.

Sunday, December 18, 2005

Causa Antecipadamente Ganha

Em minhas andanças pelo Brasil durante meus anos de consultoria de organização ouvi muitas histórias e estórias, muitas delas dignas de registro. Infelizmente não tinha naquela época tempo e faltava inspiração para as ir registrando, mas de vez em quando me lembro de alguma por provocação de fatos correntes. É o que está acontecendo agora, e não posso deixar de contá-la.
Numa das capitais de estado, cujo nome deixarei de lado (quem for de lá saberá), por volta da década de 1970 estava em construção um viaduto que ia ser batizado, quando inaugurado, com o nome de um General XPTO. Não me lembro do nome do general, mas me lembro do restante dessa história.
Seria apenas mais um viaduto como tantos outros, não fosse o fato de que terminava quase em frente a um bordel muito conhecido, que se chamava Casa da Marly.
Não custou muito para que o povão começasse a se referir ao tal viaduto em construção como Viaduto da Marly. Criou-se um certo mal estar quando os jornais mencionavam o Viaduto da Marly e suas edições eram apreendidas nas bancas pela censura vigente na época, mas o apelido pegou e nada parecia fazer com que desaparecesse.
Na véspera da inauguração do viaduto, o mais prestigioso jornal local saiu com a manchete "Será Inaugurado Amanhã o Viaduto da Marly".
Naquele mesmo dia a Casa da Marly foi empastelada pela polícia e desapareceu do mapa.
Mas o viaduto, segundo me disseram, continua a ser chamado de Viaduto da Marly, e quase ninguém sabe o nome oficial, que é Viaduto General XPTO. (Voz do povo, voz de Deus, já dizia minha avó.)
Lembrei-me porque foi criada no Rio de Janeiro a tal de Daspu, uma loja fundada por prostitutas sob os auspícios da ONG Davida, que batalha pela legalização da profissão e pelos direitos das profissionais do sexo. Consta que a Daspu se propõe a criar e vender roupas a preços acessíveis.
De São Paulo, os proprietários da conhecida Daslu, que contrariamente vende roupas a preços inacessíveis, reagiu à "imitação" do nome, tendo entrado com ação na justiça para forçar a Daspu a desistir do nome que adotou.
O assunto ganhou as manchetes dos jornais e a boca do povo, e a maioria parece apoiar a Daspu nessa contenda, muito embora muita gente saiba, ou diga saber, que a Daslu ganhará a refrega por ter muito mais dinheiro.
Pode até ser, mas está me parecendo que o nome Daspu veio para ficar, mesmo que oficialmente seja mudado: é uma causa antecipadamente ganha.

Thursday, December 08, 2005

Um homem chamado cavalo

Tive um sonho interessante.
Por dois motivos: primeiro, porque geralmente não me lembro de meus sonhos, e depois por causa da estória que vi nele.
Foi a estória do "homem chamado cavalo", misturada com outra, uma coisa confusa mas que no sonho parecia lógica.
Foi mais ou menos assim:
Vocês se lembram de um filme entitulado "Um homem chamado cavalo", que fêz bastante sucesso uns 20 anos atráz ou mais? O tal homem foi interpretado pelo Richard Harris, ainda relativamente jóvem, que apareceu como um caçador inglês na América do Norte lá pelo século XVIII.
O acampamento dos caçadores foi atacado por índios, que mataram a todos menos ao nosso herói: capturado, êle foi levado para ser o "cavalo" da mãe de um dos índios, já idosa e viúva, ou seja, para cuidar dela 24 horas por dia e fazer tudo o que ela necessitasse.
Foi uma vida estafante, mas no final o tal "cavalo" havia conquistado o coração da velha mulher, a essa altura mãe de um dos chefes da tribo que seu filho havia se tornado.
E salvou a tribo quando foi atacada por outra, graças a seus conhecimentos rudimentares de táticas de combate, - êle havia sido soldado no exército inglês, - tendo os guerreiros da tribo obedecido sem pestanejar às suas órdens em meio à situação de desespero em que se encontrava.
A coisa funcionou, evidentemente, porque a outra tribo não conhecia as tais táticas e foi pêga de surpresa.
Tempos mais tarde, ouvindo dizer que uns homens brancos vinham se aproximando, foi verificar e viu o exército americano avançando sôbre êles.
Mais uma vêz salvou a tribo, desta vêz convencendo-os a mudarem-se dali para bem mais longe, porque evidentemente as suas táticas não mais seriam suficientes para enfrentar aquele exército.
Mas dessa vêz não foi com êles: preferiu retornar ao convívio dos de sua raça.
Uns anos depois foi feito outro filme, chamado "A volta do homem chamado cavalo", com o mesmo Richard Harris, mas o sucesso do primeiro não se repetiu: não havia mais o fator surpresa que a novidade do primeiro ofereceu.
Pois é: essa estória entrelaçou-se com outra, porque estamos hoje num mundo em que um homem chamado Cavalo salvou sua "tribo" de uma convulsão social certa num momento em que a desordem da economia era completa, introduzindo um plano econômico com uma moeda de paridade fixa por decreto.
Chamou a isso de "conversibilidade", embora os cânones da economia digam que a principal condição para que uma moeda seja conversível é que seu valor possa flutuar livremente ao sabor das fôrças do mercado, sem imposições de qualquer outra espécie que possam mascarar o seu real valor.
Ora, em meio à perplexidade do momento a coisa foi bem aceita e funcionou, embora, evidentemente, ninguém queira comprar a tal moeda de paridade fixa por decreto como negócio, ou seja, a tal "conversibilidade" nunca teve credibilidade.
Tendo salvo a "tribo", pelo menos momentaneamente, o homem se retirou, e aí a "tribo", que não sabia fazer outra coisa, continuou com a mesma tática por longo tempo.
As outras "tribos" ficaram apenas olhando, ninguém disse nada mas nem sequer pensou em fazer a mesma coisa, - provàvelmente todo mundo sentia que aquilo podia estourar a qualquer momento, bastava uma dor de barriga repentina mais forte para jogar o barroso no ventilador, - mas a coisa continuou funcionando por algum tempo porque encontraram outra "tribo", mais ao norte, que aceitou bancar o "cavalo" dela, comprando seus produtos apesar da moeda supervalorizada e suportando o prejuizo que isso causava.
O truque foi convencer a outra "tribo" a não desvalorizar a sua moeda tanto quanto devia, até que um belo dia essa outra "tribo" se cansou e… deixou sua moeda flutuar ao sabor do mercado.
Aí foi um Deus nos acuda: os "brancos" estavam chegando!
Não sabendo o quê fazer, chamaram de novo o homem chamado Cavalo. Mas desta vez ficou mais difícil fazer a coisa funcionar, embora as outras "tribos" do mundo continuassem perplexas diante da insistência do tal homem em manter a paridade fixa e a "conversibilidade" da moeda por decreto.
Nesse momento acordei e não vi o fim do filme.
Cá no meu bestunto fico pensando como será o fim do segundo filme: o quê será que está realmente acontecendo? Será que a tal "tribo" deixa de ter moeda própria e adota a moeda de paridade como sua? Se é assim, o quê acontece quando êles emitem a sua própria moeda? E quem é que realmente terá o comando da economia deles se realmente adotarem a moeda de paridade? E se estiverem certos, porque é que as outras "tribos" não adotam a mesma tática? Será que deu a louca no mundo e todos estão errados menos êles? Porquê ninguém põe a boca no trombone? Ou será que estão dando corda só para cansar o cavalo? Ou que no fim vão cair definitivamente do cavalo?
Se alguém souber o fim do segundo filme, mande-me um e-mail dizendo qual é: estou ansiosíssimo por saber. E, sobretudo, se alguém souber qual é a mágica, diga logo, porque todas as outras "tribos" do mundo seguramente devem estar muuuuuuuuuuuuuito interessadas em saber.
Aguardo as respostas dos amigos, enviando a todos um grande abraço, apesar de ainda estar meio zonzo por me lembrar de um sonho desses, eu que raramente sonho ou me lembro de meus sonhos.

P.S. O sonho acima aludido ocorreu quando Domingo Cavallo era ministro da economia da Argentina pela segunda vez. Descrevi-o sob a forma do conto acima, que mandei para o pessoal de minha lista naquela época. Muito pouca gente respondeu alguma coisa: parecia que ninguém queria se atrever a dizer qualquer coisa enquanto os "grandes" continuavam a não se manifestar a respeito do que me parecia um completo absurdo.
Luiz A. Góes